DF: 'Morre com dignidade', diz policial a garoto agonizando após batida
Familiares dos cinco adolescentes de Brasília mortos em um acidente
após perseguição policial durante o carnaval fecharam a BR-020 na altura
de Planaltina na manhã desta quinta-feira (19) para denunciar suposta
omissão de socorro. Os garotos ocupavam um carro com placa clonada e
desobedeceram a ordem de parada de uma equipe da PM. Vídeos mostram
membros da corporação debochando de duas vítimas que agonizavam no
asfalto. Homens que não aparecem no vídeo chegam a falar: “Chora não",
"você não rouba, c******? Você não rouba, desgraça?", "assume o papel de
homem" e "morre com dignidade”. Por e-mail, a Polícia Militar informou
ao G1 que abriu investigação para saber se a fala é de PMs do DF ou de
policiais de outra corporação – a perseguição contou também com
policiais de Goiás e rodoviários. “Todo policial é
formado para servir e proteger a sociedade, como sempre fizemos. Este
tipo de atitude isolada que denigre a imagem da corporação não será
aceita”, declarou em nota a PM do Distrito Federal.
A
PM de Goiás disse também estar apurando o caso. "[A imagem] não nos
permite dar informações conclusivas, uma vez que mostram apenas um dos
momentos da ocorrência, não fazendo alusão às circunstâncias anteriores
ou posteriores, de um acompanhamento policial que iniciou no Distrito
Federal.
As imagens estão sendo analisadas, para
identificar a participação de policiais militares do estado de Goiás
que, porventura, tenham apoiado as equipes da PMDF no momento do
acidente." Em um determinado momento da gravação,
um policial, que não aparece no vídeo, ilumina com uma lanterna um dos
jovens agonizando no chão e diz: "Olha, moço, o tamanho dessa carniça".
O promotor de Justiça Nísio Tostes disse que está analisando as imagens e vai estudar quais procedimentos serão adotados.
Acidente - O
acidente aconteceu na madrugada de domingo. A equipe da PM tentou
abordar o carro em que estavam os jovens, com idades entre 12 e 18 anos,
na entrada de Planaltina. O motorista tinha 17 anos.
Ele se recusou a
parar e acabou colidindo com outro veículo na entrada de Formosa, no
Entorno do DF. Três garotos morreram na hora, incluindo o condutor.
Policiais teriam tirado as vítimas do carro e as colocado no chão. Pai
do menino de 12 anos que aparece agonizando nas imagens, o pedreiro
José Cícero Ferreira, de 44 anos, se disse “chocado” com as filmagens.
“Estava viajando e quando soube da notícia voltei correndo.
Eles mataram
uma criança. Eles tinham que ter socorrido o meu filho. Na hora em que
eles bateram, os policiais tiraram os meninos do carro e jogaram no
chão. Meu filho estava pedindo socorro e não ajudaram. Tenho certeza que
os policias têm filhos. Não acredito que conseguiram fazer isso com o
meu. A gente não quer briga, só queremos paz e justiça.” Pai do menino
que dirigia o carro, o motoboy Raimundo Ribeiro, de 41 anos, criticou a
ação policial. “Meu filho trabalhava e estudava à noite, nunca teve
passagem [pela polícia].
Queremos justiça para que policiais nunca mais
façam isso com os outros”, afirmou. A mãe do
garoto, a zeladora Maria Lúcia Ferreira, de 39 anos, também se disse
revoltada com a situação. Ela declarou ao G1 tentar, por meio do
protesto, limpar o nome do filho. “Ele não era bandido. A perseguição
começou, eles podiam ter parado os meninos, mas não fizeram nada para
barrar a perseguição e houve o acidente”, disse, emocionada.
Os
familiares levaram cartazes para a rodovia e vestiram camisetas com
fotos das vítimas. Eles também fizeram rodas de oração. Durante o ato,
que durou duas horas e meia, policiais militares revistaram parte dos 70
manifestantes, o que gerou clima de revolta. O grupo fechou a via por
20 minutos, mas disse que não pretendia voltar a bloquear o trânsito. Morador
da região, o estudante de direito Juliano da Silva, de 25 anos, também
se mostrou indignado com os vídeos e com a postura dos policiais
envolvidos. “Não interessa se é bandido ou não. Na hora do socorro os
policiais tiraram eles do carro e isso já foi um erro.
As pessoas têm
que ser bem tratadas. Os jovens daqui não têm lazer, não têm justiça,
não têm esporte. Queremos um tratamento igual.” Também presente ao
protesto, o advogado Gilson dos Santos afirmou que vai entrar com
representação no Ministério Público no início da tarde para pedir a
averiguação da conduta dos policiais. O motoboy
Sigenaldo Souza, 34 anos, declarou que o filho, que tinha 15 anos, e
três amigos mortos no acidente iam para uma festa na Estância 3.
A
quinta vítima não morava em Planaltina, conhecia “de vista” os meninos e
ofereceu carona ao grupo. A perseguição ocorreu depois do evento. "Foi a
famosa 'carona da morte'", afirmou. O pedreiro
Juscelino de Matos, de 53 anos, contou que o filho, de 18 anos, chegou a
ser levado para o Hospital de Base com um corte na boca e no
supercílio, além de uma perna quebrada. “Se tivessem socorrido mais
rápido, tinham salvado a vida do meu filho. Eles podiam ter feito um
cerco, pelo menos meu filho estaria preso, mas vivo.” O garoto
era filho único e havia se alistado recentemente no Exército. “A gente
sabe que ele não vai mais voltar, mas esses policiais precisam pagar
pelo que fizeram.”
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